Vigésimo nono título do norte-americano Philip Roth, Indignação confirma uma vitalidade notável num escritor com 76 anos. Após quatro narrativas centradas nos temas da morte e da decadência física e sexual (de O Animal Moribundo, de 2001, até O Fantasma Sai de Cena, em 2007, todos editados pela Dom Quixote), Roth volta a distinguir o perfil de personagens isoladas sobre a tela histórica da América; uma proeza que, sobretudo em A Conspiração Contra a América (2004), lhe valeu aprovação incondicional. Em Indignação, a personagem chama-se Marcus Messner e é um jovem judeu, morto aos vinte anos, cujo fantasma-narrador, condenado a revivê-lo eternamente, nos explica o seu percurso auto-destrutivo. Ainda que algo desequilibrado, o curto romance contém o melhor que Roth ainda nos dá: a versão literária de uma intensa explosão emocional.
A década é a de 50, pouco depois do início da Guerra da Coreia. Marcus frequenta uma universidade em Neward, a sua cidade natal. Filho de um talhante kosher, é um aluno aplicado e um filho exemplar e tem «um grande talento para [se] dar por satisfeito» com a vida. Daí que, quando o pai começa a manifestar um pânico neurótico quanto ao bem-estar do filho (chegando a trancar-lhe a porta de casa), Marcus decide partir para uma universidade distante, onde irá estudar História da América e Administração Pública. No campus Winesburg, no Ohio (uma alusão ao fictício campus perfeito do escritor Sherwood Anderson), apaixonado por uma suicida e em luta com as convenções religiosas, Marcus mostrar-nos-á «a forma terrível, incompreensível, como as opções de uma pessoa, mesmo as mais banais, fortuitas e até cómicas, têm o resultado mais desproporcionado».
O choque com a família, antes idealizada, é o motor do distúrbio. A luta tosca, e até cómica, do protagonista contra uma moralidade opressiva já não tem a força de choque das confissões masturbatórias de Alexander Portnoy (Complexo Portnoy, 1969). Mas Messner é, como Portnoy, um jovem judeu americano comprimido entre dois mundos: o da 'pureza' kosher, reminiscência do velho mundo judeu, e o do ateísmo e erotismo libertários, explosões americanas nos anos 50. Roth mantém-se um mestre inigualável a forçar as personagens à auto-análise e à detonação emocional, satirizando as suas contradições internas e a sua relação com o mundo exterior.
Indignação, Philip Roth, 175 págs.
SOL/ 02-10-2009
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)