Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

domingo, dezembro 05, 2010

História Vida Privada - Um Livro Por Dia

Nós, em privado

Portugal tem por fim uma História da Vida Privada. Um feito de José Mattoso. Quarenta colaboradores para cerca de duas mil páginas de texto, divididas por quatro períodos/volumes. Milhares de dados sobre a evolução das mentalidades dominantes quanto ao público e ao privado. Com direcção do historiador medievalista e antigo monge beneditino José Mattoso, aí está a primeira sistematização e síntese da História da Vida Privada em Portugal. Ao primeiro volume, A Idade Média, coordenado por Bernardo Vasconcelos e Sousa, seguir-se-ão A Idade Moderna (Nuno Gonçalo Monteiro), A Época Contemporânea (Irene Vaquinhas) e Os Nossos Dias (Ana Nunes de Almeida). Somos nós, portugueses, vistos pelo buraco da fechadura.
Como na História da Vida Privada (Afrontamento) dos franceses Georges Duby e Philippe Ariès, em foco estão as mentalidades (quadro social, padrões de comportamento, costumes), a vida privada das pessoas e das famílias (organização, valores e objectivos) como expressão prática das convenções de um grupo numa época. Explora-se o «oculto, o íntimo e o doméstico», matéria excitante para a curiosidade não científica. Os tabus e os interditos relativos à sexualidade são «talvez o capítulo mais revelador e de consequências mais complexas».
Um rei (D. Pedro I) condena uma mulher «que lhe poinha as cornas» a um mercador. Um cancioneiro revela que uma mulher «co dedo / havede'lo con'usado», forçada pela impotência do marido; outro, preocupa-se com a concorrência que lhe faz uma lésbica, «tam desejosa ch'és de cono com'eu». É sobretudo nas cantigas de escárnio e maldizer que se mostram os comportamentos quotidianos desviantes à moral sexual determinada pela legislação e discursos clericais e régios. O clero monopoliza a escrita, «dita as normas, expõe as crenças, legitima as práticas». Mas, «o que se passa na vida privada deve ser secreto», o que faz que, antes do séc. XII e nos três séculos seguintes, as informações sejam raras e «difíceis de interpretar». São, por isso, «incipientes» os artigos de vários especialistas  nas três secções do livro («Espaços e lugares»; «O corpo»; «... e a alma»). Esta é a primeira incursão possível num território ainda com muitos segredos velados.

História da Vida Privada em Portugal (vol. I)
José Mattoso (direcção)
Bernardo Vasconcelos e Sousa (coord.)
Temas e Debates/Círculo de Leitores(CL)
512 págs., 33.30 euros/26.64 euros (promoção CL)

SOL/ 26-11-2010
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)