Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

sexta-feira, janeiro 20, 2017

2016


Bíblia (Vol. I, Novo Testamento)
trad. Frederico Lourenço
Quetzal

Frederico Lourenço propôs-se traduzir a versão do Antigo e do Novo Testamentos apelidada de Versão dos Setenta ou Septuaginta, traduzida do hebraico para o grego koiné (comum) entre o séc. III e o séc. I a.C., em Alexandria, crê-se que por setenta e dois rabinos, respondendo a setenta e duas questões, em setenta e dois dias. A publicação do primeiro de seis volumes (quatro dedicados ao Antigo Testamento, dois ao Novo) deste projeto hercúleo, com conclusão prevista para 2019, foi o grande acontecimento editorial de 2016. Destinada a crentes e a não crentes, a versão de Frederico Lourenço é apresentada como a mais completa até à data, contendo oitenta livros, mais catorze do que as versões protestantes e mais sete do que a versão do latim da Vulgata. Incluindo notas e comentários do tradutor, a nova Bíblia em português acentua o valor universal e literário do «Livro dos Livros».

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À Luz do que Sabemos
Zia Haider Rahman
Quetzal


Zia Haider Rahman nasceu no Bangladesh, formou-se em Inglaterra, trabalhou em Wall Street, especializou-se como advogado em direitos humanos e, em 2014, publicou este primeiro romance, de inspiração autobiográfica, escrito com uma inteligência e um fôlego narrativo ímpares. O narrador (sem nome) reproduz o relato de vida que lhe foi feito, em 2008, por Zafar, seu amigo dos tempos de Oxford nos anos 80. Em mais de 700 páginas de «digressões, tangentes, análises minuciosas e reflexões amplas», entre o Afeganistão, o Bangladesh, a Inglaterra e os EUA, desenvolve-se uma epopeia sobre o que significa ser deslocado de um país, de uma classe social, de uma cultura, de uma certeza ou de um preconceito. Como a verdade dos números, a realidade esconde-se atrás de ícones. De que nos vale o conhecimento para tentarmos modificá-la?

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Vozes de Chernobyl
A Guerra Não Tem Rosto de Mulher 
Svetlana Alexievich
Elsinore

Merecidamente distinguida com o Prémio Nobel da Literatura em 2015, Svetlana Alexievich firmou um novo género, o «romance de vozes», baseado na pesquisa e colagem de testemunhos, a meio caminho entre a ficção e o jornalismo. A Guerra Não Tem Rosto de Mulher (de 1985) e Vozes de Chernobyl (1997) integram um projeto literário notável, através do qual a escritora se propôs contar uma história alternativa, moral, do «homo sovieticus». O primeiro título é um registo inédito das experiências de duzentas mulheres ex-combatentes no conflito russo-alemão de 1941-45. O segundo reúne relatos de cerca de cem testemunhas do desastre no quarto reator da central nuclear bielorussa de Chernobyl em 1986 e das suas consequências. Dramático, comovente, o trabalho de Alexievich veio redimensionar «a medida do nosso tempo na terra».

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À Beira do Abismo
Ian Kershaw
Dom Quixote

Reputado biógrafo de Hitler, o historiador inglês Ian Kershaw considera a Alemanha o «centro pivot» do continente e, por isso, centrou este primeiro volume da sua história monumental do século XX europeu no período entre 1914 e 1949 e no jogo de poderes que, a partir daquele país, determinou as duas guerras mundiais e impeliu o continente para a autodestruição. À Beira do Abismo, organizado de forma cronológica, explica como o medo generalizado do futuro e o «cheque em branco» dado pela Alemanha à Áustria-Hungria resultaram na catástrofe de 1914 e como «a intensidade inédita e assustadora da violência política» entreguerras cimentou a competição entre três sistemas incompatíveis: o comunismo, o fascismo e a democracia liberal. Uma abordagem judiciosa, importante para o entendimento das reminiscências atuais de um passado imperialista, nacionalista e xenófobo.

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Todos os Contos
Clarice Lispector
Relógio d’Água

Oitenta e cinco histórias, escritas entre os 19 anos e os dias anteriores à morte, revelam Clarice como grande experimentalista e contista fenomenal. Com edição, introdução e notas do biógrafo Benjamin Moser, a reunião de Todos os Contos pela primeira vez num só volume é para guardar na estante mais privilegiada e ler e reler até à exaustão. Por vezes com estruturas «cubistas», noutras com encadeamento circular, no final mais diretas e imediatas, cada um dos textos testemunha o clarão estranho do talento da escritora, transcendente e visionário, ou apenas, como ela própria defendeu, abstrato porque «figurativo de uma realidade mais delicada e mais difícil, menos visível a olho nu». Quem não leu ainda Laços de Família, «O ovo e a galinha» ou «Ele me bebeu», já não tem desculpa.

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A Gorda
Isabela Figueiredo
Caminho

«Todas as personagens, geografias e situações descritas nesta narrativa são mera ficção e pura realidade.» A advertência da autora indicia a natureza autobiográfica deste romance, surpreendente pelo tema, comovente no tom testemunhal, realista e cru, mas melancólico, com que narra a história da protagonista. Ela, «a gorda», não suporta o seu corpo porque aprendeu, como todos à volta, «a rejeitar o invulgar, o excessivo». Ao mesmo tempo, resiste e ama-o, usa-o como arma, ele é como a casa-organismo dentro da qual se refugia, protegida pelo papá e pela mamã. O mundo lá fora é feroz e opaco, mas a muralha de carne transforma-se em palavras e estas voam como nos sonhos da infância. A Gorda é um romance sincero e notável.

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Habitarei o Meu Nome
Saint-John Perse
Assírio & Alvim

Quem saberá ainda que o poeta francês Saint-John Perse (de seu nome verdadeiro Alexis Léger, nascido nas Antilhas Francesas,) ganhou o Nobel da Literatura em 1960? Por essa altura, num discurso proferido ao lado de André Malraux, disse: «A poesia, irmã da ação e mãe de todas as criações, iniciada em todas as ciências e predecessora de todas as metafísicas, é a animadora do sonho dos viventes e a guardiã mais segura da herança dos mortos.» A sua, distinta pelo recurso a vocabulário obscuro, aristocrática no uso do verso-prosa, atenta aos ritmos e aos sons das palavras e ao simbolismo das imagens, é objeto de nova antologia em português (a anterior data dos anos 60, assinada por Alfredo Margarido e Carlos Cunha), com seleção e tradução de João Moita.

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Obra Poética, Vol.I
Ruy Cinatti
Assírio & Alvim

Trinta anos após a morte do poeta e a edição de uma primeira antologia da sua poesia e prosa, organizada por Joaquim Manuel Magalhães, vinte e quatro sobre a reunião da poesia a cargo de Fernando Pinto do Amaral, a Assírio & Alvim inicia a edição da Obra Poética de Ruy Cinatti, com um primeiro volume dedicado aos poemas publicados em vida, «em livro ou folheto». A fixação de texto partiu das últimas versões revistas pelo poeta e é assinada por Luís Miguel Gaspar, que contou com a colaboração de Joana Matos Frias e Peter Stilwell na organização, revisão e anotação da edição. Como Matos Frias, doutorada em 2006 com uma dissertação sobre a poesia de Cinatti, escreve, no prefácio, trata-se de «um murro no gosto [do] público»: «É com certeza aqui que se encontra a razão da resistência e do fascínio, da fuga e da força, da distância e da intimidade que esta obra parece provocar.»

SOL 24-12-2016
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)