Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

quarta-feira, julho 06, 2016

David Grossman | Entrevista

 
David Grossman: «Sou uma pessoa secular, muito, muito judia.»

David Grossman costuma dizer que não aceita considerar a sua vida interior e criativa como uma zona de guerra. Mas foi nos despojos da Shoá, do conflito israelo-palestiniano e do luto por um filho morto no comando de um tanque de combate que o escritor encontrou as palavras mais fortes e inventivas. Capazes de vencer o silêncio e atravessar o tempo, como só o faz a grande literatura.

David Grossman, nascido em Jerusalém em 1954, é um dos quatro gigantes da literatura israelita [a par de Amos Oz, Aharon Appelfeld e Avraham B. Yehoshua). Filho de um condutor de autocarros que se converteu em bibliotecário, em criança e adolescente encontrou nas histórias de Sholem Aleichem e de Franz Kafka um escape para a solidão. Cumpriu os quatro anos de serviço militar, durante os quais conheceu a sua futura mulher, formou-se em filosofia e trabalhou na rádio nacional durante duas décadas, até se demitir por ter sido impedido de noticiar a declaração de independência do Estado da Palestina (1988).
Ativista político, desencantado com a política sionista, tornou-se uma das vozes mais fortes de apelo à reconciliação num país que de «Estado das vítimas» se transformou em interlocutor ensurdecido pelo ódio e pela suspeita perante o inimigo. Com os seus romances e ensaios (ver caixa), Grossman compôs um panorama único de Israel desde a sua fundação, quando à noite as ruas ainda se enchiam de gritos dos sobreviventes da Shoá, até à atualidade, quando o bruaá cosmopolita e artístico procura sobrepor-se à experiência radical da perda e da violência.

Do shtetldo leste europeu até Israel contemporâneo, passando pelo cenário de assimilação norte-americano, talvez a única caraterística comum a todos os autores de literatura judaica seja o conflito latente entre a afirmação individual do autor e a fidelidade à memória e à pertença a uma tradição. Concorda?
Essa tensão foi uma constante ao longo de toda a história dos judeus e tornou-se premente desde o século XVIII e o Iluminismo Judaico [movimento Haskalá; determinou o estudo crítico moderno dos textos fundadores, a assimilação no mundo secular europeu, o aparecimento de movimentos políticos de emancipação, o renascimento do hebraico e a divisão do judaísmo asquenazi em diversos movimentos religiosos e denominações; dele surgiu a cultura judaica secular, que privilegia a história e a identidade como elementos unificadores, em detrimento da religião]. Nesse contexto, Israel representa um desafio particular: é uma sociedade moderna, sofisticada, virada para o futuro, mas, ao mesmo tempo, alberga muitos fundamentalismos e conservadorismos, um enorme peso dado à religião. Como conciliar tudo isto? Não conseguiremos resolver estas contradições enquanto não tivermos a paz. Porque, quanto mais desesperadas se sentem as pessoas, mais elas se viram para a religião, sobretudo nas suas manifestações mais herméticas. É um círculo vicioso. Quanto menos paz tivermos, mais fanatismos teremos, o que, por sua vez, compromete qualquer solução secular de compromisso.

O que é que Israel retira hoje do judaísmo?
Há grupos que retiram apenas os elementos mais beligerantes e racistas. Mas também há outros que querem absorver de facto a pluralidade e a iluminação contidas no judaísmo. Eu sou uma pessoa secular, muito, muito judia. Sinto uma fortíssima pertença ao judaísmo.

Que se traduz em quê?
Na maneira como vejo o mundo, no meu humor, na afinidade que sinto com o destino judaico, com a Shoá, com a língua hebraica. É algo muito emocional; pertenço ao judaísmo tal como pertenço à minha família. Escolhi viver em Israel porque é ali que o judaísmo está mais presente, em todas as suas contradições e facetas. Todas as semanas, desde há 25 anos, faço o que os judeus fizeram ao longo da sua história: na companhia de duas pessoas, leio a Bíblia, com a ajuda de uma lupa, estudo-a e discuto-a. É frequente essas serem as horas mais significativas da minha semana.

Revelando o quê?
O modo como fomos criados enquanto povo. A personalidade dos nossos pais fundadores: Jacó, Abraão, Isaac. Como eles estão presentes na política atual. A forma como definimos a nossa diferença em relação aos outros, tornando-a indecifrável por eles. Por vezes, a maneira como desejamos sentir-nos únicos, excomungados, entrincheirados na nossa cultura e na nossa maneira de ver o mundo.

Tal qual como numa injoke [anedota perceptível apenas pelo grupo que a cria e sobre o qual versa]?
Sim, sim. Quando leio a Bíblia, exponho-me à luz cristalina da linguagem bíblica. Aprendo muito com as histórias e as personagens da Bíblia. De facto, sou muito judeu, e muito israelita também.

Mais um do que outro?
Não quero sequer decidir o que sou mais: se judeu, se israelita. Faço parte daquela realidade tão tempestuosa e escolhi viver ali, apesar de ter tido muitas oportunidades, e muito tentadoras, de me instalar no exterior. Quero viver a minha vida num sítio com relevância para mim. Consigo descodificar os códigos de Israel e dos israelitas, mesmo quando eles me esfrangalham os nervos. Em Israel, fazem-se coisas terríveis.

Acha que, se as compreender, consegue transformá-las?
Não sei se consigo transformá-las, mas pelo menos identifico a raiz de certos comportamentos. Quero viver uma vida relevante e Israel dá-me essa oportunidade, mesmo se tantas vezes me enfureço com as atitudes do governo, do exército, das comunidades civis, dos fundamentalistas.

O problema não será ver-se Israel como o fim da diáspora e não como uma etapa de um caminho que prossegue?
Sabemos que qualquer fim é sempre o início de outra coisa! Israel está em permanente contato com a diáspora. Israel não é um fim; é apenas um veículo para que os judeus possam viver uma vida normal, da qual foram privados nos últimos dois mil anos. É curiosa a sua pergunta. Na verdade, muitos chamam a Israel a Terra Prometida, mas o correto é Terra Sempre Prometida. Trata-se de uma promessa permanente, nunca atingida.

Quando acabei de reler Ver: Amor, fiquei a pensar num paradoxo: o realismo não é suficiente quando se escreve sobre situações extremas. Passou-se assim com a literatura sobre a Shoá. Após a primeira geração de escritores-testemunhas, as gerações seguintes tiveram de recorrer à imaginação, para colorir as primeiras imagens a preto e branco.
Não creio que colorir seja um bom termo. Em Ver: Amor, usei o realismo mágico, não para colorir, mas para analisar a situação sob um outro ponto de vista. O romance corresponde a quatro tentativas muito diferentes de escrever sobre a Shoá: do realismo de Momik à corrente de consciência e realismo mágico de Bruno, ao registo quase teatral da relação entre Wasserman e Niegel e, no final, ao estilo enciclopédico ou semi-científico. Havia uma quinta parte, da qual desisti, porque senti que quatro eram suficientes para mostrar a impossibilidade de escrever sobre a Shoá. Sabemos que vamos falhar, mas temos de continuar a tentar. Por vezes, penso que olhar para a Shoá assemelha-se a olhar diretamente para o sol.

La Rochefoucault disse que «para o sol e para a morte, não se olha de frente».
É belíssima a frase. É algo que eu sinto. De uma forma muito forte... Senti-o enquanto escrevia sobre a Shoá e senti-o ao escrever Até ao Fim da Terra [ensombrado pela morte do filho, Uri Grossman, de 20 anos, abatido por um míssil do Hezbollah, em Agosto de 2006, poucas horas antes do cessar-fogo entre Israel e o Líbano]. Há coisas para as quais não podemos olhar de frente porque nos cegam. Ainda assim, porque sou escritor, tenho de olhar para elas. Essa é a principal missão de um escritor: não fugir à radiação ardente da Shoá ou de um luto pessoal...

O escritor que escreve sobre a Shoá tem de aceitar que jamais conseguirá dizer tudo e que jamais será completamente compreendido pelos outros.
Concordo. E, no entanto, os dois, escritor e leitores, terão sido parceiros na tentativa humana de compreender algo. Não tentaram evitá-lo ou negá-lo. Assumiram esse fardo e toda a tristeza nele envolvida e tentaram olhar a Shoá nos olhos. Foi por isso que escolhi pôr Momik no início do livro, apesar de essa ter sido a última parte a ser escrita. Senti que precisava de captar o modo como uma criança tenta entender a Shoá. Porque, mesmo se formos adultos e tivermos lido todos os livros, visto todos os filmes, estudado todas as abordagens históricas, subsistirá sempre uma pequena parte de nós que, tal como acontece com as crianças, é incapaz de compreender.

Estamos dentro da radiação, mas não conseguimos dar-lhe uma forma?
Perante as perguntas principais, somos crianças indefesas, mesmo que sejamos adultos. Como é que alguém foi capaz de fazer uma coisa assim?

É inegável que pensar a Shoá é um fardo muito particular. Mas não acha que, num certo sentido, é também um ato que envolve algum masoquismo? Escarafunchamos na tristeza e no horror, como se sofrêssemos de uma espécie de síndroma do sobrevivente (Elie Wiesel disse: «Estou vivo, logo sou culpado»), e não conseguimos parar. Quanto mais percebemos que não conseguimos compreender, mais obcecados ficamos.
É verdade. Haverá sempre quem explore esse lado masoquista... Pode-se abusar de tudo, e também da Shoá. Mas... [silêncio longo] Não há «mas»! Penso que existem três formas de tentar superar este fardo. Uma, é a via científica: procurar compreender como aconteceu. A outra é a das memórias dos sobreviventes. A terceira é a via da arte. Ora, haverá cada vez menos sobreviventes e a via científica extinguir-se-á em breve (são conhecidos praticamente todos os factos que havia para conhecer). A expressão artística será a principal forma de gerar empatia nas gerações futuras em relação à Shoá.

Em Ver: Amor, Bruno sente uma espécie de rebelião que o expulsa de si mesmo, enquanto Momik encara a perda como uma forma de resgate de si mesmo. Trata-se do mesmo movimento paradoxal: de tentativa de libertação e de resgate...
... de esquecimento e de rememoração, de pertença e de exclusão. Há um momento em Falling Out of Time [de 2014, ainda não editado em Portugal] em que o pai enlutado se pergunta como poderá um dia recordar-se sem sofrer. Como separar a memória da dor? A questão coloca-se tanto no luto individual como no luto coletivo. Outra questão é: como recordar sem ficar paralisado pelas memórias? E como esquecer, no sentido de deixar ir? Como esquecer sem matar os que já morreram e como lembrar sem morrer por causa disso?

Neste último romance, parece ter encontrado a resposta na poesia.
Uma das personagens do livro diz: «A poesia é a linguagem do meu luto.» Foi o que aconteceu comigo. Não o planeei, não o preparei, mas de repente passei da prosa à poesia, instintivamente. A poesia era de facto a forma mais precisa para descrever o que eu sentia. Não me pergunte porquê. Não sei responder. A minha mulher tem uma teoria: diz que a poesia está mais próxima do silêncio. Gosto dessa ideia.

Afirmou algures que, durante a Shivá [período de sete dias de retiro de luto, tradicionalmente observado pelos judeus], a dor como que o fossilizou.
A Shivá é uma grande invenção judaica. Todas as pessoas que conheceste de uma forma próxima desde a escola primária, enfim, desde sempre, vêm visitar-te, estar contigo durante uma ou duas horas, abraçar-te fisicamente. Durante uma semana, a tua vida toda desfila diante de ti. Milhares de pessoas vieram visitar-nos, a mim e à minha mulher, durante a Shivá pelo Uri. No dia seguinte, regressei ao meu espaço de trabalho e à escrita de Até ao Fim da Terra, que, antes disso, estava prestes a terminar. Foi muito difícil. No início, limitei-me a forçar-me a estar fechado, sozinho. Depois, aos poucos, dei por mim a escrever e a dar aos meus personagens calor, vitalidade, senso de humor, atração sexual... vida! Percebi que havia vida dentro de mim e que podia dá-la aos outros.

Nos seus livros, está muito presente a ideia de que a morte é o mais escandaloso dos escândalos.
[ri] Claro, como é possível concebermos que vamos morrer? Temos tanta vida dentro de nós e, afinal de contas, a vida é tão boa — pelo menos se considerarmos a alternativa. Existe tão pouco tempo para compreendermos e conhecermos tanta coisa que há para compreender e conhecer... Sinto desde sempre que só consigo compreender as coisas verdadeiramente importantes da vida, se escrever sobre elas. E já sei que não terei tempo para escrever sobre a maior parte das questões mais importantes. Nem que vivesse cem anos... Sim, tudo o que tem a ver com a morte é escandaloso.

Então, é nos opostos da morte, na memória e na arte, que devemos procurar a vida?
Wisława Szymborska falou na «vingança da mão que escreve». Apercebi-me disso sobretudo durante a escrita  de Até ao Fim da Terra [2008] e de Falling Out of Time. A arte é a única instância onde a vida e a sua perda coexistem.

O único sítio fora do tempo?
Sim, é isso: o único sítio fora do tempo.

Como define as novas gerações de escritores israelitas?
A literatura israelita é extraordinariamente viva e rica. É impressionante. Hoje, coexistem seis gerações de escritores, dos 20 e poucos anos até aos 90 [Aharon Megged tem 95]. Muitos dos mais novos não têm qualquer interesse em escrever sobre a guerra ou sobre a Shoá; deixam esses temas para as gerações mais velhas. Deu-se uma espécie de ruptura da cadeia do judaísmo e da literatura judaica para a literatura israelita: hoje é mais correto falar em literatura produzida por escritores que nasceram em Israel. Eles escrevem sobre a vida quotidiana. Sobre Telavive...

... que é uma das cidades mais vitais do mundo...
Muito! Adoro Telavive, embora essa vitalidade nem sempre crie grande literatura. Hoje, existe um surto de criatividade em Israel, talvez em resposta à situação paranoide em que vivemos [devido ao conflito israelo-palestiniano]. As afirmações estéticas são quase todas individuais. Mas há agora um grupo bastante forte de escritores e poetas de origem sefardita oriental que sentem que não foram suficientemente representados na literatura israelita, se manifestam contra a velha elite asquenazi e reivindicam maior protagonismo — apesar de existirem vários autores sefarditas altamente reconhecidos, como Sami Michael, Eli Amir ou Sara Shiló. Não me parece mal; na arte, o conflito é sempre bem vindo porque é um motor de mudança.

O David nasceu em Israel, a sua mãe nasceu na Palestina, o seu pai na Galícia [região a oeste da atual Ucrânia e ao sul da Polónia]. Quando começou a escrever, nos jornais e depois ficção, era um autor de origem asquenazi, nascido em Israel, que tinha estudado a língua árabe desde os 15 anos de idade. Essa condição singular fê-lo distinguir-se de outros autores da sua geração?
Não sei definir-me nesses termos. O que escrevo tem mais a ver com algumas características da infância: um sentimento profundo de solidão, uma consciência vívida da morte. O papel da imaginação na minha vida era muito, muito maior do que na vida das outras crianças.

Como acontece com Momik?
Eu era bastante parecido com ele. Acho que a maior parte da minha infância foi vivida debaixo de água. Ninguém sabia ou poderia imaginar o que se passava dentro da minha cabeça. A imaginação era a principal fonte da minha vitalidade e da felicidade que sentia, mesmo passando a maior parte do tempo sozinho.

Que papel teve a solidão ao longo da sua vida de escritor?
A maior parte da minha vida foi vivida sozinho, fechado num quarto. Mesmo agora, com todo este circo [mediático] à minha volta, passo diariamente pelo menos oito a nove horas isolado, a escrever, e adoro poder fazê-lo. Se não consigo ter esse tempo para mim, fico nervoso, irritadiço, alérgico, resmungão, feroz mesmo! [risos]

Fica sozinho e em silêncio?
Às vezes, oiço música: clássica, sobretudo, mas também algum jazz. Quando o ritmo do que estou a escrever estanca ou me parece contraditório, paro e fico em silêncio, sem me mexer, durante um bom bocado. Quando acabo de escrever um livro, releio-o todo em voz alta, e só então é que consigo encontrar-me pela primeira vez com a história. É incrível: por mais que o escritor tenha consciência do plano definido, das personagens, do livro que está a escrever, é como se este existisse autonomamente, numa espécie de ângulo morto da mente. O principal permanece sempre desconhecido.

E silencioso.
O mundo hoje é tão horrorosamente ruidoso... Está tão cheio de clichés e generalizações... Sinto-me um verdadeiro privilegiado por, através da arte, poder procurar as palavras mais precisas e luminosas por entre a espessura e a opacidade do mundo.

Isso é completamente judeu: procurar o sentido no silêncio. Parar o tempo e reordená-lo.
[ri] É claro que é.

Num certo sentido, essa maneira de estar e de ver o mundo implica desligar-se dos outros, não?
Enquanto judeu, não me sinto desligado, sinto-me diferente. Mas não é assim que se sente toda a gente? Diferente e única?

-- X --

Caixa 1:
David Grossman estreou-se em 1983, com O Sorriso do Cordeiro, o primeiro romance israelita sobre a ocupação, no qual um contador de histórias palestiniano relata como fez um jovem soldado israelita, Uri, seu refém. Apesar disso, em 1987, quando o jornal Koteret Rashit o enviou em reportagem para os territórios ocupados, Grossman não imaginava com certeza que se tornaria o arauto da primeira Intifada. A reportagem em questão, O Vento Amarelo: retrato da Palestina ocupada (Dom Quixote, 1989), chocou os israelitas ao revelar a dimensão do ódio dos palestinianos contra eles, tornou-se um símbolo premonitório das sequentes duas décadas de conflito e trouxe fama internacional ao autor.
No ano anterior, 1986, Grossman publicara Ver: Amor, a sua obra-prima. Dividido em quatro partes que cobrem de forma não linear quase todo o século XX, o romance narra as fantasias de uma criança israelita (Momik) sobre os fantasmas da Shoá e da Besta Nazi na vida da sua família; o modo como, já adulto e escritor, Momik reescreve a biografia do escritor polaco Bruno Shultz, transmutando-o em salmão; as vivências do tio-avô de Momik enquanto escritor de livros infantis e depois prisioneiro (imortal) de um campo de concentração e protegido de um comandante nazi; por fim, o registo enciclopédico da vida inteira de um homem contida em apenas 24 horas de existência. Tour de force estilístico e metafórico, Ver: Amor é uma das mais imaginativas abordagens ficcionais do tema da Shoá.
Seguiram-se ficções com temáticas, estilos e técnicas muito diferentes, numa bibliografia marcada pelo experimentalismo e pelo impulso autobiográfico. Ver:Amor está disponível nas livrarias portuguesas pela Dom Quixote, assim como o anterior romance, Até ao Fim da Terra (2008). Nele, Ora, uma fisioterapeuta de Jerusalém, recém-divorciada, percorre Israel em direção à Galileia, de forma a antecipar-se à chegada da notícia da morte do filho, voluntário numa grande ofensiva de combate contra os palestinianos no início da segunda Intifada. Enquanto questiona qualquer perspetiva de futuro para Israel, Ora rememora a sua história pessoal, que se cruza com a história coletiva do país desde a fundação, em 1948. O livro seguinte de David Grossman, Falling Out of Time, é um íntimo e poético memorial de luto pela perda de um filho e tem edição prevista para Portugal em 2016.
Entre os livros de não-ficção de Grossman, destacam-se A Morte como Forma de Vida (2003), recolha de textos jornalísticos sobre o conflito israelo-palestiniano, e uma colectânea de ensaios sobre literatura e política (2008; ed. inglesa, Writing in the Dark, Picador; ed. francesa, Dans la Peau de Gisela, Seuil), que inclui o famoso discurso em defesa da paz proferido pelo escritor três meses após a morte do filho, diante de cem mil israelitas que assinalavam o aniversário do assassinato de Yitzhak Rabin. O romance mais recente do escritor israelita chama-se Um Cavalo Entra Num Bar, passa-se num bar de comédia stand up e ainda não existe previsão de data de lançamento por cá.

LER| Outono 2015
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