Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

terça-feira, janeiro 18, 2011

Philip Roth | Judeu, eu?


Saiu há 41 anos. O Complexo de Portnoy, de Philip Roth, ainda é uma leitura de choque.
No consultório de um muito silencioso psicanalista judeu, Alexander Portnoy, 33 anos, amarrado à sua própria consciência judia, explora as «auto-estradas da vergonha, da inibição e do medo» que lhe atravessam o corpo, «como um autêntico mapa de estradas». Da desesperada tentativa de fuga à cartografia que herdou da família resulta um longo monólogo, no qual se liberta e expõe «a líbido deste bom rapazinho judeu», o grande masturbador. Aquilo de que sofre será baptizado pelo clínico como «complexo de Portnoy»: «Perturbação na qual profundos impulsos éticos e altruístas entram em perpétuo conflito com desejos sexuais descomedidos, muitas vezes de natureza perversa». O romance homónimo, escrito por Philip Roth quando tinha 36 anos (hoje tem 77), é um marco do humor e do sexo na literatura norte-americana. Representa também a emancipação e assimilação dos judeus americanos filhos da geração da Shoah. Pela Dom Quixote, sai uma nova tradução (a última data dos anos 80).
Logo na ficção de estreia, Goodbye, Columbus and Five Short Stories (de 1959, ainda por traduzir, aliás como a maioria dos títulos de Roth anteriores a 1995), a sátira semi-autobiográfica do escritor ao universo judeu dos subúrbios de NY (na cidade-natal de Newark) enfureceu rabinos e comunidades judaicas. Ainda assim, nada os preparara para o choque d'O Complexo de Portnoy, em 1969. Sem freios, delirantemente cómico, Portnoy/Roth apresenta a sua fúria masturbatória como resposta directa ao condicionamento familiar, centrado na moral e na culpa, na chantagem afectiva, na típica conjugação judia de orgulho e autodepreciação, obstinação e vitimização. Grita: «Sou o filho da anedota de judeus - só que não é anedota nenhuma!» Entalado entre a consciência e a libido, descreve, numa magnífica e indecorosa coloquialidade, a infância e adolescência (as manobras da mãe judia manipuladora, as somatizações do pai), a rejeição dos códigos religiosos e da herança da diáspora, as aventuras eróticas adultas. Escudado na afirmação psicanalítica do poder do Id, Roth explode em sarcasmo e agressividade sexual. O Complexo de Portnoy relata uma emancipação desesperadamente humana, das mais cómicas e provocatórias alguma vez descritas na literatura.

O Complexo de Portnoy, Philip Roth, Dom Quixote, 266 págs.

SOL/ 11-06-2010
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)