Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

quinta-feira, fevereiro 14, 2013

Os melhores dos últimos 25 anos


O que fica do que foi (editado em Portugal nos últimos 25 anos)

Alexandra Alpha, José Cardoso Pires, Dom Quixote, 1987
Até ao Fim, Vergílio Ferreira, Bertrand, 1987
O Medo, Al Berto, Contexto, 1991
Último Volume, Miguel Esteves Cardoso, Assírio & Alvim, 1991
História de Portugal, José Mattoso (dir.), 1993-95, Círculo de Leitores
Amar um Cão, Maria Gabriela Llansol, Colares Editora, 1990
O Erro de Descartes: emoção, razão e cérebro humano, António Damásio, Europa-América, 1995
Ensaio sobre a Cegueira, José Saramago, Caminho, 1995
Tratado da Evidência, Fernando Gil, IN-CM, 1996
A Situação Social em Portugal, António Barreto (org.), ICS-UL, 1996-2000
Manual dos Inquisidores, António Lobo Antunes, Dom Quixote, 1996
Poesias Completas, Alexandre O’Neill, Assírio & Alvim, 2000
Pode um Desejo Imenso, Frederico Lourenço, Cotovia, 2002
A Ronda da Noite, Agustina Bessa-Luís, Guimarães, 2006
As Saias de Elvira e Outros Ensaios, Eduardo Lourenço, 2006
Século Passado, Jorge Silva Melo, Cotovia, 2007
Uma Grande Razão – Os poemas maiores (antologia), Mário Cesariny, Assírio & Alvim, 2007
Combateremos a Sombra, Lídia Jorge, Dom Quixote, 2007
“O Nosso Século É Fascista!”, Manuel Loff, Campo das Letras, 2008
Ofício Cantante - Poesia Completa, Herberto Helder, Assírio & Alvim, 2009 620 pp.
Dicionário do Judaísmo Português, VVAA., Editorial Presença, 2009
Adoecer, Hélia Correia, Relógio D’Água, 2010
Uma Viagem à Índia, Gonçalo M. Tavares, Caminho, 2010
Peregrinação de Enmanuel Jhesus, Pedro Rosa Mendes, Dom Quixote, 2010
Obra Poética, Sophia de Mello Breyner Andresen, Caminho, 2010

Primeiro, um desvio ao parâmetro temporal desta seleção dos 25 melhores livros de autores portugueses publicados entre 1987 e 2011. Por seis anos, falha a entrada na lista um dos maiores romances portugueses do século XX, senão o maior: Sinais de Fogo, de Jorge de Sena, editado em 1979. Imperdoável, seria não o referir. E porque poucas vezes ele é apontado, também, como a abordagem mais frontal e artisticamente conseguida do tema da sexualidade (e da homossexualidade) na ficção portuguesa, acrescento-lhe outra, também marcante, a de Frederico Lourenço, em Pode um Desejo Imenso, de 2002. Ainda no romance, oito outros destaques, por ordem cronológica. De 1987, Alexandra Alpha, onde, com a sua jocosidade certeira e hipercrítica, José Cardoso Pires ajusta contas com a intelligentsia portuguesa (neste caso, a burguesia intelectual lisboeta dos anos 60 e 70), como nenhum outro o fez depois dele. Do mesmo ano, Até ao Fim, monólogo de um pai no velório do filho, expressão máxima do existencialismo ateu, humanista, de Vergílio Ferreira. De 1990, Amar um Cão, uma boa porta de entrada no universo de originalidade radical de Maria Gabriela Llansol, sobre o qual Eduardo Lourenço vaticinou: será «o próximo grande mito literário da literatura portuguesa».
Salto até 1995 e Ensaio Sobre a Cegueira, súmula da força estilística (e ideológica) da ficção de José Saramago. Em 1996, António Lobo Antunes publica Manual dos Inquisidores, retrato cru do Portugal pós-25 de Abril, romance maior numa obra polifónica e experimental que depois se tornou cada vez mais um desafio para iniciados. De Agustina Bessa-Luís, escolho Ronda da Noite, de 2002, o derradeiro romance, em homenagem à obra toda, com a qual tive durante muito tempo uma relação difícil. Foi no ensaio dedicado a Santo António (de 1979) e no interesse da autora pela mística que, por fim, julguei entender a fonte da grandeza da sua escrita. Agustina escreve em comunicação com uma verdade estranha, possui uma sabedoria quase paranormal, e, lidos como visões, e não como acumulações de aforismos morais ou filosóficos, os seus livros adquirem uma verdadeira dimensão visionária. Combateremos a Sombra (2007), de Lídia Jorge, centrado na personagem do psicanalista Osvaldo Campos, é, por sua vez, um romance corajoso e apuradíssimo, prenúncio das cegueiras que vão corrompendo Portugal no novo milénio. Lídia Jorge prossegue um labor literário que, tal como o da maioria dos autores portugueses verdadeiramente grandes, merecia mais acompanhamento e análise por parte da crítica e discussão pública. Como obra master de Hélia Correia e da iluminação da sua escrita, anote-se Adoecer (2010), um «encontro pessoal» da escritora com Elizabeth Siddal, Dante Gabriel Rossetti, os pré-rafaelitas e o século XIX inglês. Ainda em 2010, dão-se outros encontros, fulgurantes: entre os dois melhores ficcionistas da geração nascida pouco antes do 25 de Abril e os dois expoentes máximos da literatura portuguesa das viagens ultramarinas. Em Uma Viagem à Índia, Gonçalo M. Tavares evoca Os Lusíadas (e Ulisses, de Joyce), para firmar uma epopeia intelectual até uma Índia psicológica, território da solidão desolada do homem contemporâneo. Em Peregrinação de Enmanuel Jhesus, Pedro Rosa Mendes evoca Peregrinação, de Fernão Mendes Pinto, para tornar física, real, uma epopeia de confronto com o passado no presente.
Na poesia, destaco, por afinidade eletiva, as antologias da obra de Al Berto, Alexandre O’Neill, Mário Cesariny (para quando a edição integral?), Herberto Helder e Sophia de Mello Breyner Andresen. Na crónica, Miguel Esteves Cardoso, pela imprevisibilidade do estilo e pelo retrato paródico do modo de ser português, e Jorge Silva Melo, em Século Passado, que é autobiografia, divagação, sobretudo registo de um crítico, encenador e intelectual de exceção.
Na Filosofia, saliento a investigação «epistémica» de Fernando Gil sobre a possibilidade da evidência. Na área da História, destaque absoluto para os oitos volumes da História de Portugal, com colaborações dos melhores historiadores portugueses. Nota especial também para Dicionário do Judaísmo Português, no qual, sob coordenação de Lúcia Mucznik, José Alberto Tavim, Esther Mucznik e Elvira de Azevedo Mea, mais de 60 especialistas reuniram, pela primeira vez, o conhecimento sobre a presença judaica, desde o séc. V, no território hoje português e sobre a diáspora dos judeus de origem portuguesa no mundo. Destaco ainda “O Nosso Século É Fascista!”, de Manuel Loff, escolha pessoal, pelo que me deu a descobrir sobre as relações entre Salazar e Franco e as suas visões do mundo entre 1936 e 1945.
E, porque rever 25 anos de edição por autores portugueses é como arrumar a casa, uma útil arrumação do estado da nação dificilmente poderá passar ao lado do diagnóstico d’ A Situação Social em Portugal entre 1960 e 2000, feito por vários investigadores, sob organização de António Barreto. Deixo para o fim, mas para os destacar como primeiros entre os primeiros, Eduardo Lourenço e António Damásio, figuras máximas da cultura e da ciência portuguesas nos últimos 25 anos.

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