Pó enamorado: E as Montanhas Ecoaram, Khaled Hosseini

Khaled Hosseini retratou o amor filial   e o Afeganistão  e arrasou as tabelas. Outono de 1952, Afeganistão. Na aldeia isolada de Shadbagh, ...

domingo, dezembro 19, 2010

Bioy Casares - Um Livro Por Dia

A invenção de Casares

«Plano de Evasão» foi escrito em 1945 por Adolfo Bioy Casares (1914-1999), criador de parte do melhor legado argentino para a literatura universal, a par de Ernesto Sábato, Julio Cortázar e sobretudo do seu amigo Jorge Luis Borges (com quem assinou obras sob o pseudónimo conjunto de H. Bustos Domecq). Editada pela Estampa em 1980, a obra regressa agora pela Cavalo de Ferro. Embora sem a fama de romances de Casares como «A Invenção de Morel» (Antígona), «O Sonho dos Heróis» ou «Diário da Guerra dos Porcos» (ambos na Cavalo de Ferro), é um portento de imaginação e construção narrativa.
A acção data de 1913 e o cenário é a colónia penal instalada no Arquipélago da Salvação (Guiana Francesa), composto pelas ilhas de São José, Royale e do Diabo, apelidadas de «Devoradoras de Homens» devido aos brutais métodos prisionais nelas praticados. Bioy Casares coloca o epicentro deste mistério de solução fantástica na Ilha do Diabo, celebrizada também com «Papillon», de Henri Charrière. É lá que o governador Pedro Castel domina a seu bel prazer animais e prisioneiros.
Como na maioria das ficções de Casares, a personagem principal, o tenente Henrique Nevers, é um herói «inadequado», cujas metamorfoses psicológicas servem a máxima estilística: «[Na escrita] não se pode cortar caminho». Impedido de ir à Ilha do Diabo, Nevers hesitará sempre até à descoberta das verdadeiras dimensão e consequências da sua nomeação como administrador da colónia, sob as ordens de Castel. Os seus passado e futuro estarão suspensos de uma estranha percepção da realidade que domina as personagens, a acção, e o leitor.
A chave para o mistério reside nas teorias de Castel. Para ele, «a unidade essencial dos sentidos das imagens, representações ou dados, existe e é uma alquimia capaz de converter a dor em deleite e as paredes da prisão em planícies de liberdade.» Libertar as sensações humanas dessa ordenação original significaria «um caos onde tudo, segundo certas regras, poderá ser imaginado ou criado».
Casares é um mestre da estruturação da narrativa, composta por uma filigrana de frases curtas, minuciosas descrições, narrações e sinais, sobre um fundo de suspense e humor grotesco. A quimera de liberdade de Castel é revelada a partir de um talento literário que se apresenta também como espantoso manipulador dos sentidos.

Plano de Evasão, Adolfo Bioy Casares, 127 págs.

SOL/ 11-08-2007
© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)